A iluminação, seja ela natural ou artificial, é um dos elementos mais importantes da arquitetura, impactando diretamente na percepção dos espaços em geral. É a partir dela que se entende a relação entre dimensão, proporção e contrastes. É na ação dela que podemos ler as texturas, definir volumes e enfatizar cores. A arquitetura tem como um de seus desafios moldar espaços a partir da luz e sombra, sendo que muitas vezes é necessário conduzir a iluminação para além da natural, introduzindo e controlando outras fontes de luz.
Ao mesmo tempo, desde os primórdios a arquitetura lida com o desafio de criar elementos para captar, refletir, diluir e emitir luz, revelando assim sua materialidade e conduzindo a ambiência de um espaço. Para além do domínio da iluminação natural, tido como um dos grandes trunfos dos grandes arquitetos da história, seja na arquitetura gótica, seja na contemporaneidade com Álvaro Siza, muitos projetos trazem a necessidade de uma boa condução da iluminação artificial para valorização e bom funcionamento dos espaços.
Assim como podemos ver neste artigo que mostra as possibilidades da iluminação artificial para melhorar projetos, as estratégias de iluminação artificial estão relacionadas tanto a necessidades vindas da funcionalidade do projeto, quanto às diretrizes e conceitos definidos pelos arquitetos e clientes. A seguir, exploramos alguns projetos que usam de diferentes estratégias empregadas em projetos de interiores brasileiros.
Há lugares que exigem abundância de iluminação, como é o caso de salões de beleza ou consultórios médicos. No projeto do Salão de Beleza Lushe Beauty, localizado em São Luiz e projetado por Roby Macedo arquitetura e design,por exemplo, os arquitetos desenvolveram uma grande luminária em formato geométrico, com luz indireta para garantir boa iluminação em toda a área, e para complementar, introduziram uma luz suave e aconchegante embutida nos espelhos retro iluminados, com dimerizador. Além disso, também pode-se ver algumas iluminações de destaque nas paredes verdes, ressaltando as diferentes texturas e cores das plantas.
Esta mesma solução de uma grande luminária que percorre todo o ambiente também é vista no Consultório Rafael Paiva por URBANODE arquitetura, com a diferença de que aqui a luminária promove a iluminação direta no espaço. Além disso, este consultório também conta com uma luminária focal, sobre a mesa de atendimento, e outra na bancada próxima ao banheiro, duas fontes secundárias de luz que auxiliam no funcionamento da clínica.
Nesta outra clínica, a Clínica MJanson Ortodontia projetada por Caracho Arquitetos, as estratégias de iluminação artificial mudam de acordo com a funcionalidade dos espaços, uma vez que ela tem como objetivo atender pacientes e também proporcionar cursos e seminários. Nos espaços de atendimento a estratégia é abundância de luz direta, enquanto na recepção, por exemplo, utiliza-se de luz focal de efeito, e também aproveita-se da iluminação difusa vinda da parede translúcida, que é iluminada tanto naturalmente quanto artificialmente.
Outro ambiente que exige estratégias específicas de iluminação é o ambiente corporativo. Ainda que muito tenha mudado nos ambientes corporativos recentemente, a iluminação continua sendo um elemento importante do ambiente de trabalho, que interfere tanto na produção, quanto na qualidade de vida, considerando a quantidade de tempo que passamos no trabalho. O projeto da Bcredi, assinado pelo Arquea Arquitetos, mostra uma variedade de estratégias de iluminação dedicadas a diferentes espaços de trabalho.
Para espaços mais coletivos, de confraternização, o projeto usa iluminação direta com spots em trilho, direcionadas para paredes e bancadas. Já para espaços mais introspectivos de trabalho, eles usam uma luz mais amarela, focal sob a mesa. Em outros espaços coletivos, os arquitetos optaram por uma luminária direta com desenho em zigue zague de lâmpadas tubulares, uma escolha que dá identidade ao ambiente de trabalho, enquanto na descompressão, a luz pontual favorece o momento de relaxamento. Além disso, neste caso a luz destaca as diferentes texturas dos materiais empregados no projeto, a madeira OSB e o concreto da estrutura.
Um lugar onde é possível sair da funcionalidade e arriscar nas estratégias de iluminação são as lojas comerciais. O projeto da Loja Fast Shop Lifestyle Ibirapuera do Kengo Kuma & Associates demonstra isso ao organizar seu projeto entorno das estratégias de iluminação. O layout da loja é dividido em salas como "News”, “Cinema em casa”, “Cozinhando com a família e amigos”, “Conectividade”, “Cuidados Pessoais”, “Kids” e contém iluminação simbólica em cada área. A ideia é representar o hábito do ser humano e da família, em casa, de se reunir em torno da luz. A iluminação da loja varia entre luzes diretas, indiretas, difusas, destaques e de efeito, aproveitando as propriedades de diferentes texturas, materiais e formas, e a maneira como eles filtram ou rebatem a luz.
Em uma perspectiva diferente dessa assinalada pela Fast Shop, a Loja Conceito da Dengo Chocolates do Matheus Farah e Manoel Maia Arquitetura, utiliza da iluminação para criar espaços cênicos com simplicidade, utilizando iluminação de destaque e de efeito, além da iluminação natural. Essa mesma técnica é usada na Cervejaria Toca do Urso do SuperLimão Studio. No projeto, eles mesclam tipos diferentes de luzes, buscando um balanço entre luz natural e artificial, que é atingido através de aberturas zenitais e bandejas de luz. Há um alto índice de Iluminação natural e, a iluminação artificial segue como suporte, em pontos estratégicos, como no corredor que marca a entrada.
Até aqui vimos que espaços comerciais têm bastante abertura para usar de estratégias menos convencionais de iluminação artificial, porém, isso também é possível em projetos habitacionais. O projeto Loft Solar / Talita Nogueira Arquitetura é um ótimo exemplo disso. Conciliando obras de arte e um ambiente minimalista, o projeto esbanja diferentes estratégias de iluminação artificial. Na sala de estar, por exemplo, um rasgo emite luz saindo do forro, iluminando a parede em uma espécie de wall washing, destacando a obra que compõe a parede. Em outra parede do loft, essa técnica também é usada, mas de maneira mais difusa. Além disso, o apartamento usa de luminárias secundárias em alguns ambientes, como é o caso da sala de jantar, a mesa e cadeiras recebem iluminação focal por meio de luminárias pendentes,
No projeto da Suíte Neurosensorial pelo Piacesi Arquitetos Associados também foi empregada a iluminação de efeito, por meio de fitas de luz diretas que percorrem não só o teto, mas também as paredes do cômodo. Segundo os arquitetos, as decisões luminotécnicas trabalhadas no projeto são uma solução importante para conferir aconchego ao espaço, onde o bem-estar é alicerçado através do iluminar.
Por fim, não é só de estratégias ousadas, que mesclam o cênico com o funcional, que se iluminam apartamentos e casas. Muitas vezes, estratégias simples são importantes para consolidar um ambiente aconchegante. Como é o caso do Apartamento Praça Henrique Monteiro do Studio Arthur Casas. Neste projeto, além de usarem iluminações secundárias de destaque, nas prateleiras e em outros pontos como nos dormitórios, uma estratégia interessante foi a de embutir a iluminação na cortina que acompanha a janela. Dessa forma, uma das fontes de iluminação artificial, direta, se relaciona com a fonte de iluminação natural, consolidando as ambiências noturnas e diurnas no apartamento.
Os projetos selecionados mostram que o domínio sobre como a iluminação, natural ou artificial, age em um determinado espaço, nos faz ter o controle do ambiente que habitamos, e daqueles que queremos criar. O arquiteto Sou Fujimoto afirmou, em relação à sua instalação para a COS, loja de moda suíça: “Essas luzes pulsam e se submetem constantemente à transitoriedade da situação e do fluxo. (...) luz e pessoas interagem entre si, com sua própria existência definindo a transição da outra". Apesar de estar descrevendo sua obra, essa ideia também pode ser aplicada quando pensamos no uso da luz para moldar, não só espaços, mas também ambientes, ambiências e rotinas.
